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ATIVIDADE
DE LÍNGUA PORTUGUESA
O texto a seguir é um
fragmento do "Auto da Compadecida", de Ariano Suassuna, uma peça
teatral de fundo popular e religioso.
O trecho faz parte da cena do julgamento, na qual
as personagens, após a morte, aguardam uma decisão quanto a seu futuro. O
Encourado, que as recebe, manda o Demônio levá-las para o inferno. As
personagens, aos gritos, resistem. Repentinamente, João Grilo, falando bem
alto, diz que tem direito a um julgamento. As outras personagens o apoiam.
Nesse momento, pancadas de sino começam a soar. O Encourado fica agitado.
"JOÃO GRILO - Ah! pancadinhas benditas! Oi, está
tremendo? Que vergonha, tão corajoso antes, tão covarde agora! Que agitação é
essa?
ENCOURADO - Quem está agitado? É somente uma questão de
inimizade. Tenho o direito de me sentir mal com aquilo que me desagrada.
JOÃO GRILO - Eu, pelo contrário, estou me sentindo muito bem.
Sinto-me como se minha alma quisesse cantar.
BISPO, estranhamente emocionado. - Eu também. É
estranho, nunca tinha experimentado um sentimento como esse. Mas é uma vontade
esquisita, pois não sei bem se ela é de cantar ou de chorar.
Esconde o rosto entre as mãos. As pancadas do sino continuam
e toca uma música de aleluia. De repente, João ajoelha-se, como que levado por
uma força irresistível e fica com os olhos fixos fora. Todos vão-se ajoelhando
vagarosamente. O Encourado volta rapidamente as costas, para não ver o Cristo
que vem entrando. É um preto retinto, com uma bondade simples e digna nos
gestos e nos modos. A cena ganha uma intensa suavidade de Iluminura. Todos
estão de joelhos, com o rosto entre as mãos.
ENCOURADO, de costas, grande grito, com o braço
ocultando os olhos - Quem é? É Manuel?
MANUEL - Sim, é Manuel, o Leão de Judá, o Filho de Davi.
Levantem-se todos, pois vão ser julgados.
JOÃO GRILO - Apesar de ser um sertanejo pobre e amarelo,
sinto perfeitamente que estou diante de uma grande figura. Não quero faltar com
o respeito a uma pessoa tão importante, mas se não me engano aquele sujeito
acaba de chamar o senhor de Manuel.
MANUEL - Foi isso mesmo, João. Esse é um de meus nomes, mas você pode me chamar também de Jesus, de Senhor, de Deus... Ele gosta de me chamar Manuel ou Emanuel, porque pensa que assim pode se persuadir de que sou somente homem. Mas você, se quiser, pode me chamar de Jesus.
MANUEL - Foi isso mesmo, João. Esse é um de meus nomes, mas você pode me chamar também de Jesus, de Senhor, de Deus... Ele gosta de me chamar Manuel ou Emanuel, porque pensa que assim pode se persuadir de que sou somente homem. Mas você, se quiser, pode me chamar de Jesus.
JOÃO GRILO - Jesus?
MANUEL - Sim.
JOÃO GRILO - Mas, espere, o senhor é que é Jesus?
MANUEL - Sou.
JOÃO GRILO - Aquele Jesus a quem chamavam Cristo?
JESUS - A quem chamavam, não, que era Cristo. Sou, por quê?
JOÃO GRILO - Porque... não é lhe faltando com o respeito não,
mas eu pensava que o senhor era muito menos queimado.
BISPO - Cale-se, atrevido.
MANUEL - Cale-se você. Com que autoridade está repreendendo
os outros? Você foi um bispo indigno de minha Igreja, mundano, autoritário,
soberbo. Seu tempo já passou. Muita oportunidade teve de exercer sua
autoridade, santificando-se através dela. Sua obrigação era ser humilde porque
quanto mais alta é a função, mais generosidade e virtude requer. Que direito
tem você de repreender João porque falou comigo com certa intimidade? João foi
um pobre em vida e provou sua sinceridade exibindo seu pensamento. Você estava
mais espantado do que ele e escondeu essa admiração por prudência mundana. O
tempo da mentira já passou.
JOÃO GRILO - Muito bem. Falou pouco mas falou bonito. A cor
pode não ser das melhores, mas o senhor fala bem que faz gosto.
MANUEL - Muito obrigado, João, mas agora é sua vez. Você é
cheio de preconceitos de raça. Vim hoje assim de propósito, porque sabia que
isso ia despertar comentários. Que vergonha! Eu Jesus, nasci branco e quis
nascer judeu, como podia ter nascido preto. Para mim, tanto faz um branco como
um preto. Você pensa que eu sou americano para ter preconceito de raça?
PADRE - Eu, por mim, nunca soube o que era preconceito de
raça.
ENCOURADO, sempre de costas para Manuel - É
mentira. Só batizava os meninos pretos depois dos brancos.
PADRE - Mentira! Eu muitas vezes batizei os pretos na frente.
ENCOURADO - Muitas vezes, não, poucas vezes, e mesmo essas
poucas quando os pretos eram ricos.
PADRE - Prova de que eu não me importava com cor, de que o
que me interessava...
MANUEL - Era a posição social e o dinheiro, não é, Padre
João? Mas deixemos isso, sua vez há de chegar. Pela ordem, cabe a vez ao bispo.
(Ao Encourado.) Deixe de preconceitos e fique de frente.
ENCOURADO, sombrio - Aqui estou bem.
MANUEL - Como queira. Faça seu relatório
JOÃO GRILO - Foi gente que eu nunca suportei: promotor,
sacristão, cachorro e soldado de polícia. Esse aí é uma mistura disso tudo.
MANUEL - Silêncio, João, não perturbe. (Ao Encourado.)
Faça a acusação do bispo.
(Aqui, por sugestão de Clênio Wanderley, o Demônio traz um
grande livro que o Encourado vai lendo.)"
Exercícios:
1. O texto teatral e o
texto narrativo apresentam semelhanças: tanto um quanto o outro narram fatos
vividos por personagens em determinado tempo e lugar.
a) Qual é o fato principal
desse texto?
b) Onde possivelmente
ocorrem os fatos?
5. O texto teatral é
escrito para ser representado. Nessa cena, que tipo de variedade linguística
predomina:
a) culto formal b) culto informal c) regional d) popular
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